O meu amigo buraco

Ó velho amigo que regressas com saudade... gosto em ver-te! Tal como todos os bons amigos, regressas sem avisar, ano após ano, para me fazer uma surpresa. Estás sempre ali no mesmo sítio, no cruzamento à saída da minha casa.

Avenida Duque de Ávila com a estação da Carris, Arco do Cego, 1940.Eduardo Portugal, in Arquivo Fotográfico da C.M.L

Avenida Duque de Ávila com a estação da Carris, Arco do Cego, 1940.
Eduardo Portugal, in Arquivo Fotográfico da C.M.L

Os meus pneus tratam-te por “tu”. E iria jurar que já te vi com uma das minhas jantes a beber uma mini enquanto passava o Nacional-Benfica na Sport TV.

Impressionante esse teu ritual, digno do mundo animal – tal e qual hibernação – em que todos os anos, todos, teimas em aparecer sempre que caem as primeiras chuvas.

Penso que saibas que não sou engenheiro civil, muito menos engenheiro de estruturas. Não tenho experiência em planeamento urbanístico... e nunca trabalhei em construção civil. Mas arriscarei afirmar que voltas sempre, saudoso e contente, porque alguém não está a fazer o trabalho que devia.

Não me leves a mal. Gosto da tua companhia. Gosto de te apresentar com pompa e surpresa aos meus amigos. “Olha... ali está ele!”, digo com expressão efusiva no rosto. Admiro igualmente a forma como treinas as minhas aptidões automobilísticas, apanhando-me de surpresa naqueles finais de tarde em que regresso, cansado, ao meu pouso.

Mas como qualquer bom amigo, também tu meu caro buraco, por vezes me deixas zangado. Incapaz de conter um expressivo “Fodass” ou um surpreso “Mas que caralh....” que é seguido atentamente por aquele senhor de setenta e poucos, que da passadeira olha para dentro da minha viatura como quem olha para a jaula dos tigres. “Gente mal educada” pensará certamente.

Sim meu companheiro! A partir de hoje estamos de relações cortadas! E até que tu tenhas um entendimento com os teus amigos da Câmara Municipal de Lisboa, passarei a chamar-te, com a dignidade que a ocasião impõe, de “cabrão”.

Cabrão do buraco! 

Ceuta

(Escrito a 21 de Agosto de 2015)

Faz hoje - 21 de Agosto - 600 anos que um pequeno reino europeu encheu o peito de ar, vestiu uma armadura e com um punhado de tomates considerável atravessou o mar e foi conquistar Ceuta.

conquistaceuta

Esta data não é importante apenas porque representa o início daquilo a que nós designamos de Descobrimentos. E muito menos por ter sido uma conquista pelas armas. 

É importante porque nos relembra algo com 600 anos. E ter 600 anos de história é obra! E antes desses 600 ainda existiram quase outros 300. Já andamos por cá faz um tempo

É importante porque nos galvaniza com o facto de que uma pequena nação entalada entre o mar e um reino de onde nem sequer aparecem bons casamentos ser capaz de fazer coisas grandiosas. 

É importante porque nos recorda que um dia, nós, “nação valente e imortal”, fomos donos disto “tudo”, fruto apenas da coragem, inteligência e visão demonstrada na altura.

É importante porque nos deveria elucidar para o facto de Portugal ser mais que os últimos 30 anos. São quase 900! 900 anos em que sempre que foi preciso levantámos a voz e dissemos a quem quer que viesse para aqui arranjar confusão que a coisa ía dar para o torto!

É importante porque nos deveria motivar ao saber que somos feitos do mesmo material, do mesmo sangue, da mesma fibra dos gajos que há 600 anos se meteram nuns barcos e foram ali para sul dos Algarves fazer das suas e dar novos mundos aos mundos.

E se eles o conseguiram... nós, à nossa maneira, também o podemos fazer. 

Um pouco de orgulho nacional não fica mal a ninguém. E não, hoje não joga a selecção.

www.merlin37.com/ceuta

Homenagem

(Escrito em Janeiro de 2015)

Acabo de ver o filme “American Sniper”. Pondo de parte o presente “americanismo” a parte final do filme (início dos créditos) fez-me fazer um paralelismo com a realidade nacional. Na forma como nós, portugueses, honramos quem serviu o seu país. 
 

americansniper


Faz um anos, ainda era eu oficial da Força Aérea, fui nomeado para comandar um pelotão na guarda de honra em um funeral de um General que tinha falecido. Verdade seja dita, para nós, pilotos, este género de serviço eram tudo menos desejado. Queríamos voar, voar e voar. Os nossos treinos de ordem unida era tudo menos frequentes. Mas antes de pilotos éramos militares. E ainda bem que assim o é. 


No dia estabelecido lá estávamos. Dois pelotões, impecavelmente formados, à entrada do cemitério do Alto de São João. Na hora estabelecida – e estando a urna a escassos metros da entrada do cemitério – a polícia parou o trânsito e formámos na estrada para prestar a devida homenagem com três salvas de G-3. 
Qual não é o meu espanto quando um popular, sentado na paragem de autocarro mesmo ao lado da formatura, começa a vociferar a plenos pulmões a sua indignação. “É uma vergonha” dizia. “o que é que aquela pessoa tinha a mais que ele para estar aquilo ali montado”. “Estou à espera do autocarro e quero ir para casa”. Entre outros comentários bem menos agradáveis. 
É-me impossível de descrever a raiva que me invadiu naquele momento. Vinda do mais fundo do meu ser. Daquela que nos consome. Que nos faz morder o lábio. Mas a disciplina e a rigidez militar fez que não me mexesse. Que não abrisse a boca. Nem eu nem nenhum dos militares ao meu lado. E prestámos a nossa homenagem. Não demorou mais do que três minutos. Três minutos que alguém não estava disposto a abrir mão como sinal de respeito a alguém que serviu o seu país durante mais de 40 anos. Alguém que lutou pela sua Pátria. Alguém que viveu em combate em meu nome, em nome de todos nós, em nome da nação. 

A forma como tratamos quem nos serve a todos, como país, adefine-nos como povo. Militares, polícias, bombeiros, são tantas vezes injustamente acusados em praça pública. São os chulos. Os que nos “roubam o dinheiro dos impostos”. Quando na realidade estão lá, no duro, todos os dias, dispostos a dar o melhor de si por todos nós. E mesmo que esse respeito não existisse em vida, ao menos que existisse na hora da partida...

Vejo o final do filme. Aquela homenagem nunca seria possível no meu país. E relembro aquele momento de há anos. Baixo a cara. Desta vez não de raiva. Mas de vergonha.

Chickenhawk

Conto pelos dedos de uma mão os livros que li e voltei a ler, em parte, mais tarde. Mas até hoje apenas um me cativou, por completo, duas vezes: Chickenhawk.

chickenhawk

"Lá está este gajo outra vez com helicópteros" dirá o leitor. Pelo contrário. Não me interpretem mal... Chickenhawk é sem dúvida a bíblia para qualquer piloto de helicópteros e é sem dúvida obrigatório para qualquer piloto. Mas é muito mais do que isso. É um excelente livro, e repito, excelente, mesmo para quem não tenha qualquer relação com o mundo da aviação. 

Robert Mason, ex piloto de UH-1 Huey, deixa-nos um relato nu e cru da realidade da guerra. Como costumamos dizer, "sem espinhas". Sem vergonha. Sem pudor. Sem patriotismos. Uma das mais frontais perspectivas do que foi a guerra do Vietname e o seu impacto em quem ela lutou. 

Não sabem o que ler este Natal? Acabaram-se as dúvidas.

Chickenhawk.

Days gone by

Existem discos que nos surpreendem. Não damos por eles. Que, estando perdidos numa prateleira qualquer, um dia ouvimos parte daquele som e ficamos obcecados por saber, e ouvir, mais. 

Recentemente descobri Bob Moses, e o disco "Days gone by". Álbum de 2015.  

Fabuloso. Simplesmente fabuloso. O single "Too much is never enough" é prova disso. 

Numa palavra? Se fosse puto diria "fixe!" Se estivesse nos meus gloriosos dezoito anos diria "brutal"! Como já passei a fronteira dos "intas" digo: "obrigatório"! 

Uma original prenda de Natal

Estou impressionado comigo. Já consigo fazer rimas no título das publicações. Entrei definitivamente no espírito! 

É possível que já tenham reparado na imagem de topo deste blog. A junção das asas portuguesas: a militar e a civil. Esta imagem saiu da mente artística de Miguel Amaral

Se são apaixonados por aeronáutica e ainda não sabem o que dar a outro apaixonado por máquinas do ar, poderão sempre pedir ao Miguel uma destas originais "caricaturas" para oferta. Basta escolher qual a aeronave que querem, seja civil seja militar, esperar uns dias, beber umas cervejas, ver o Benfica ganhar mais uns jogos e está feito!

artmiguelamaral.jpg

 

Se estiverem interessados poderão contactar o Miguel Amaral através do seguinte e-mail: garranaamaral@hotmail.com

 

5 de Outubro... o outro 5 de Outubro

(Escrito a 5 de Outubro de 2015)

A primeira bandeira do reino de Portugal. 

A primeira bandeira do reino de Portugal. 

 

Dia interessante esta segunda-feira de Outubro. 

Dia cinco. Liga-se a televisão, abrem-se as redes sociais, lêem-se os e-mails. E, tão previsivelmente como o meu Benfica ser campeão, fala-se sobre as eleições de ontem. Outros até celebram o 05 de Outubro como a implementação da república. Raros são – mas existem – os que celebram algo bem mais importante.

O aniversário de Portugal. 

05 de Outubro de 1143. A “nossa” data de aniversário oficial. Faz hoje 872 anos que somos oficialmente – e reconhecidamente – um país independente. E ninguém fala dela. Somos um país que não celebra a sua existência, a sua fundação, a sua história. Triste fado este. Preferimos celebrar a implementação de um sistema política à própria existência do estado em que ele é implementado. 

Arriscando tornar-me repetitivo, Portugal é mais do que os últimos 40 anos de história. É mais que os últimos 100 anos de república. Portugal anda por cá faz 872 anos. E isso é um claro motivo de celebração.

Passámos por tempos difíceis, fomos conquistados, conquistámos, demos um passo de fé e demos novos mundos aos mundo. Descobrimos, guerreámos, fomos gloriosos e fomos humilhados. Excedemo-nos, e ainda o fazemos em muitas áreas. Somos capazes do melhor e também do pior. 
Choramos com melancolia mas somos os mais alegres no reencontro. 

Temos 872 anos de história. Orgulhosa história. E isso merece um brinde! Não caraças! Merece uma grade de minis! Que é de Portugal que falamos. 

E ao brindar, diríamos como diria Afonso Henriques:

“SÃO JORGE”!

Parabéns Portugal!

Mais vale tarde do que nunca!

Bem, pelos vistos cedi. A pressão foi cruel, digna de romance barato. Os meus amigos estavam fartos de me ouvir... e vai daí criei um blog. 

Bem vindos ao Merlin 37

A partir de agora tenho finalmente um espaço para expor o sem número de coisas sem sentido que me passam pela cabeça. Passadas, presentes ou futuras. É altura de começar a reunir os textos que já foram feitos (e serão repetidos aqui, para horror do leitor) para que um dia os meus netos possam dizer do avô "este tipo era parvo". 

Aviação. Viagens. E coisas da vida. 

Assim será! 

Houve uma altura em que eu tinha cá uma pinta! (Foto: Luís Maia)

Houve uma altura em que eu tinha cá uma pinta! (Foto: Luís Maia)

(Especial agradecimento ao Miguel Amaral pelo magnífico logo)