Afinal não somos assim tão diferentes

Em Espanha, aqui ao lado, o governo caiu resultado de uma moção de censura sem precedentes na história do país vizinho. Itália está ainda (provavelmente sem surpresa) envolta em caos político, com a possível formação de um novo executivo em breve. E em Portugal a dívida pública atingiu os 250 mil milhões de Euros, aproximadamente 126% do produto interno bruto português, facto este que, independentemente da perspectiva, é um péssimo presságio para o futuro nacional. 

Hoje não faltam razões para ser notícia. E todas elas de importância clara para todos nós. 

Mas parece que, por aqui no nosso país, as preocupações são bem diferentes. Quem passar os olhos pela televisão ou dispensar cinco minutos para ler um jornal constata que, afinal, o único problema parece ser futebol. Não como notícia de rodapé. Não como notícia impressa a meio de um jornal. Nem sequer como notícia de secção desportiva. Mas como infindáveis horas de emissão em directo, de debates, de opinião pública. Se dúvidas persistissem que, como povo, temos as prioridades trocadas o dia de hoje esclareceu-as. 

Mas tudo isto não é grave por se tratar de futebol. Já sabemos que nos está no sangue este deporto. Que vibramos com ele e que é, para todos os efeitos, o escape de muitas frustrações nacionais. Contra mim falo. Vibro, grito e sofro como qualquer um. O grave não é o tema. 

Grave é o que isto comprova: que afinal, não somos tão diferentes dos nossos aliados norte americanos. 

Como Europeus gostamos de exibir uma espécie de superioridade moral face aos senhores que moram do outro lado do Atlântico. Populismo? Aqui? Jamais. Nunca seria possível eleger um primeiro-ministro com as características do presidente norte-americano. 

Pois bem, estamos há semanas a discutir um presidente de um clube desportivo, as suas atitudes e as suas tomadas de decisão. Baseadas, há que dizê-lo, em manipulação, ameaças, mentiras e populismo, criando o mesmo ambiente de crispação e de divisão nos seguidores desse mesmo clube que foi criado nos eleitores norte-americanas. O modus operandi é perigosamente semelhante. Quase idêntico e, curiosamente, com os mesmos resultados. E isto tudo, convém relembrar, falando apenas de futebol.

Somos mais maduros. Mais conscientes. Convencidos, dizemo-lo a nós próprios sem hesitação. Esta nossa arrogância prova-nos exactamente o contrário. Somos imaturos e irresponsáveis como povo. Cultivamos – em todos os sectores com responsabilidade de educação social – uma ignorância colectiva. 

E se futebol serve como barómetro para o resto do país, o futuro é tudo menos risonho. 

Porque se há algo que todo este “circo” prova é que o surgimento de um político populista não é uma questão de possibilidade. É uma questão de tempo. 

E aí? Aí o que está em causa já não é uma bola. 

São as nossas Vidas

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